sexta-feira, abril 16, 2010

16/04/2010 - 00:21

Agora parece que estamos os dois lá naquele “fim de todas as coisas”. Parece que se passou um século, dois. Parece que há atrás de nós toda uma era. E o que se foi não volta mais. Triste, não? Triste não.

Um inventário de todos os momentos, dos melhores momentos, seria um tanto inútil, para não dizer sem sentido. Porque paira no ar a impressão de que todos os momentos não foram mais do que simples ensaios para a vivência do presente, única parte do tempo em que nos reconhecemos incompletos tanto para o passado quanto para o futuro. E o que fomos ou fizemos ou não, no passado, faremos ou seremos ou não, no futuro. Mas o que dizer sobre o que somos? Não dizemos nada, queremos ser sempre aquele que fomos ou aquele que seremos e nunca o que somos realmente.

Isso tudo para falar de história, da nossa história. Olhar para os tão conhecidos e já vividos momentos e rir deles com gosto. Ou para falar do que há por vir, que queremos tanto prever e não somos capazes.

E eu me sinto cada vez mais incapaz de dizer qualquer coisa que valha sobre qualquer coisa que importe. Carrego na vida todas as boas lembranças da vida, no entanto não isentas de suas emendas e remendos, ou um parafuso faltando, uma peça solta aqui ou ali, alguma coisa sobrando em alguma parte ou faltando em outra.

Tivemos amigos (ou ainda temos?) e eles parecem que não nos tem. Mudamos imperceptivelmente e eles nada mudaram, são os mesmos e nós somos os mesmos numa versão mais aprimorada, aprendendo com erros e acertos, rindo das desgraças e mesmo lamentando pequenas alegrias paradoxalmente.

O tempo nos leva adiante, sempre. Crescemos, envelhecemos, perdemos coisas pelo caminho e não encontramos nunca mais o que nem sabíamos que procurávamos tanto. Mas amadurecemos aquelas coisas exatas as quais não se vende nem se empresta, muito menos se aluga, amadurecemos aquelas coisas que compartilhamos sempre.

Queria dizer mais, sempre. Ter em mãos uma fórmula ou uma receita. Mas essa coisa de felicidade e satisfação não cabe em lugares pequenos, motivo pelo qual temos de nos fazer grandes para as poucas coisas grandes da vida ou para as muitas coisas pequenas que realmente importam.

Eu posso me gabar de dizer diante de muita coisa que eu sabia que muita coisa seria assim mesmo. Não adivinhei e nem sei ao certo se pressenti. O saber muitas vezes não se explica com palavras, mas sim com uma certa dose de silêncio.

Deveria dizer, se pudesse, então, aquieta sua alma e sinta o cheiro e o sabor desse silêncio interior. Se acha que foi fundo consigo mesma, vá mais fundo ainda para ver o que é bom.

Na verdade, acho essa vida medíocre demais para demasiada preocupação, e curta para tantos planos. Acho o mundo ridiculamente plausível demais para ser pensado em demasia. Aliás, acho que pensamos demais, somos por demais “intelectuais” que não percebem que basta um buraco na terra e um pouco de água para cultivar uma porção considerável de beleza.

Abdico de ser este ser que pensa para ser este ser que sente que pensa. Porque não creio em absolutamente nada que me cheire a mofo, não creio em nada que vá um pouco mais além do que imaginamos poder descrever em nossos intelectuais devaneios. Nosso discurso que constrói um mundo possível e uma realidade plausível destrói desastrosamente a beleza de as coisas serem exatamente o que são.

Por que este discurso para você? Eu não sei, sou o cara que não sabe. Sou o cara que sente, embora muitas vezes nem saiba o que sente.

Talvez para dizer a você para trocar o olhar ou o espelho, ou talvez os dois a um só tempo. Para dizer que leio ainda suas coisas paradas no tempo, aquele tempo que já foi. Para dizer que as águias já vieram nos resgatar no fim de todas as coisas e que talvez tenhamos um absurdo receio de viver cada recomeço, sem as coisas todas que nos atrapalham continuar caminhando. Ou voar com a devida e insustentável leveza.

Sejamos leves, então. E sejamos os mesmos, que já deu certo e vai dar mesmo. Mas sejamos rápidos, que o tempo desconhece nossa paciência e capacidade de esperar.

Porque daqui a dez anos, vou estar velho demais para dizer as coisas e você velha demais para ouvir.