sexta-feira, outubro 24, 2008

Ainda

Ainda tem essas reticências que se espalham por meus escritos...
Ainda tem a Lua no céu, grande, linda e brilhante, mágica, misteriosa, envolvente...
Ainda tem essa brisa na varanda, um café à noite, um passeio no frio, uma sopa quente...
Ainda tem aquelas crianças que cresceram comigo e brincam com a criança que nunca deixarei de ser...
Ainda tem aquelas lágrimas que rolam despercebidas no meio de uma cena emocionante...
Ainda tem uma saudade do que foi e do que nem ainda é, às vezes até do que é e continua sendo...
Ainda tem um cheiro de terra, uma chuva fina, desenhos nas nuvens, um céu por trás de tudo...
Ainda tem aquela vontade que não se arvora vontade mas tem vontade de se arvorar...
Ainda tem aqueles sonhos esquecidos, lembrados sempre diante das ondas do mar...
Ainda tem uma certeza de que fui o que não acho mais que sou mas que sei que serei sempre...
Ainda tem essa confusão diante do tempo, misturando o presente do passado no futuro do pretérito, tudo tão perfeito, às vezes imperfeito e, quando muito, mais-que perfeito...
Ainda tem esses três pontinhos que coloco depois de tudo que sinto...

Viagens e Devaneios

Estava agora há pouco jantando e bebendo com amigos do trabalho. Mais bebendo do que jantando, tudo bem, está tudo bem, aqui faz um calor de trinta e nove graus e são sete ou oito da noite, de dia fez muito mais e estávamos sob o teto de zinco de uma quadra de esportes, das oito às dezessete. Água, muita água, refrigerante e cigarros, muitos cigarros.
Batatais, cidade que tem uma catedral que é uma quase réplica da Basílica de São Pedro, em Roma, no Vaticano, em escala um oitavo menor. Não tenho fotos, não, nao tenho fotos... e uma praça com as árvores podadas a la Edward Scissorhands! Já disse que não tenho fotos!!!
O que me traz aqui a esta cidade, meus caros, é a pura necessidade do vil metal. Na mesa do bar fico maravilhado com uma Yamaha estradeira, a estrada ainda precisa me conhecer assim, só eu e ela e uma moto, dessas grandes, o vento na cara, a barba por fazer, o cabelo por pentear, o banho por tomar numa próxima cachoeira e um futuro inteiro ainda por se traçar, como as linhas amarelas e brancas da estrada, cheias ou tracejadas, tanto faz, para se voar no tempo qualquer ultrapassagem é permitida.
De súbito, como que pego de tocaia, percebo que elas vieram: tristeza e solidão.
Conto a uma amiga que não durmo bem há uns meses e que isso não é insônia. Porque insônia é querer dormir e não ser capaz. E eu quero sempre não dormir. E quando durmo não descanso, acordo mais arrebentado do que antes quando achava que estava deveras cansado. Hein?! Eu me canso até descansando.
Ela diz: "você não encontra prazer nas coisas, ou não tem encontrado". Eureka! Reiventemos a roda!!! E que ela seja redonda e que rode e que nos guie por essa viagem. Eu não encontro prazer...
Vinte e três horas agora, eu aqui na frente da tela luminosa... é aqui que encontro prazer?!
Calor de uns trinta e cinco graus... eu não sei onde tem prazer!
Não preciso de dinheiro, guarde o seu! Não preciso de carro, vou a pé ou de ônibus (trem é preferível), não preciso de casa própria, cartões de crédito, crédito, talões de cheque, roupa ou sapatos novos, não preciso de uma máquina de lavar ou de um forno microondas, de um armário novo de cozinha, de um guarda roupa mais resistente, nem de outra cama ou de outro colchão. Não preciso de Moët Chandon (cidra serve), Guiness (bavária tá bom), não tomo whisky, não quero um celular novo, não preciso enfim que meu nome seja inserido no rol da fama dos medíocres insatisfeitos que ostentam seu sorriso de plástico e que saem bem em toda foto... não preciso, não preciso, não preciso!
Preciso de amor: amar e ser amado. Básico assim, essa coisa básica cada vez mais complicada.
E que essas perdidas noites de sono não tenham sido assim em vão!

quarta-feira, outubro 15, 2008

Ela virá...

Ela virá. Provavelmente virá. Trará seus olhos, sua boca, suas mãos e seu corpo. Trará até aqui seu corpo de curvas sinuosas e de formas generosas. Trará o irresistível toque de suas mãos. Trará toda a maciez de sua pele. O pitoresco de suas histórias e o seu jeito singelo e atirado de ver as coisas. Trará esse pouco caso de lidar com intimidade compartilhada. Não fará nenhuma pergunta, não oferecerá nenhuma resposta. Não acrescentará nenhuma reflexão sobre essa distância no tempo e no espaço e os efeitos que supostamente provoca.
Ela virá como se nunca tivesse ido. E chegará como se eu nunca tivesse ficado aqui, imerso em minhas reflexões sobre a distância no tempo e no espaço e sobre todos os efeitos que certamente provoca. Ela virá como se tivesse onisciência, como se soubesse que sou feito de incapacidades, feito de uma tola força que me obriga a uma insuportável espera. Ela virá como se o tempo tivesse em mim só o efeito de passar simplesmente e não o de me transformar.
Ela virá para as coisas que imagina que deixou no lugar. Para as mesmas coisas. E vai querer encontra-las no mesmo lugar em que deixou, e do mesmo modo, e as mesmas coisas.
Ela virá e não tocará nesse vazio. Não iluminará essa escuridão. Não trará o fogo necessário para o frio de todas as noites, as passadas e as vindouras. Não quebrará com música e poesia esse insuportável silêncio. E não me olhará nos olhos. Não prestará atenção ao mínimo sussurro que soe como um grito, não se importará com a dor que afinal é alheia, alheia a ela, a todos e a tudo.
Ela virá e não sentirá o peso de minha tristeza. Não saberá em que canto da casa escondi essa vontade de chorar. Não saberá me sentir absorto e perdido em pensamentos naquela sacada, olhando o céu por detrás dos prédios, uma lua alta e brilhante no céu. Não me verá desfazendo-me aos poucos, entregando-me à inevitabilidade disso a que chamam destino. Ela virá e não saberá em que parte da história entra, em que ato dessa ópera bufa. Terá perdido sua deixa e não será capaz de improvisar.
Entrará péla porta errada. Sairá pela janela errada. Deitará na cama errada. Tentará ainda ser amada pela pessoa errada.
Ela virá e não encontrará ninguém em casa. Virá e não mais me encontrará.
Vai estranhar um outro brilho em meus olhos. Um outro perfume que se alastra em minhas lembranças. Não vai entender meus pensamentos distantes e suspensos no tempo e no espaço, anulando de vez toda distância. Não vai entender uma outra presença que não a dela e nem um coração não se agitar não por ela. Não vai entender que meu coração quando grita não ama e quando se cala não se engana. E não saberá mais não ser o que nunca quis ser e temerá que tudo seja assim. Não saberá mais nada de mim. Se soubesse talvez não viria.
Mas a verdade é que ela virá e nada nem ninguém a impedirá de vir...
Nem me afastará dela e nem mudará a verdade da incerteza de meus sentimentos.
Nada me tirará dessa inútil e tola espera que deixo viver em mim mesmo sem querer.
Estou só no fim de todas as coisas e nada nem ninguém virá me salvar.
Até só restar ela... e mais ninguém!

quarta-feira, outubro 08, 2008

Ponto Crítico

A solidão e a tristeza não são mais minhas amigas... ah, deixa disso! essas linguagens poéticas, esse linguajar tonitroante e randômico, essas voltas em torno de nada para dizer nada sobre tudo... (quem fui que me deu essa bronca?)
A verdade é que não estou achando mais graça nenhuma nessa coisa de solidão e tristeza. E no momento não preciso de nenhum poeta tão filho da puta como eu para dizer como isso é. Preciso apenas de uma palavra: foda!
Quando você chega a um ponto crítico de sua vida, ou a um ponto em que seu espírito crítico já versou sobre tudo, não há mais volta. Há um enorme abismo entre este mundo aqui e o mundo de lá que você almeja, anseia, sei lá o quê (parece que nem as palavras querem mais ser minhas amigas...), enfim, este mundo que você já digeriu e o outro mais além que se apresenta como um banquete de iguarias totalmente novas, desconhecidas, nunca dantes experimentadas. Então tem que haver entre esses mundos uma ponte sobre o abismo. Isso: uma ponte sobre o abismo. Ou você a constrói ou usa as que estão construídas. Uma corda entre dois pontos, uma ponte de corda, ou de concreto ou ferro. Então você chega desse outro lado e o que acontece? Nada... você olha para trás e sente saudade daquele velho mundo que era tão confortável, conhecido, onde você estava tranquilo e acomodado. O novo assusta, mesmo quando ele nem se apresentou ainda.
Vou fazer o quê daqui para frente? Pontes que me levam de nenhum lugar a lugar algum. Eis o dilema das palavras e das imagens. Toda a realidade é mais filha da puta do que eu posso ser.
Chega de brincar de ter sentimentos. Dói estar sozinho e incomoda ser assolado pela tristeza. Um dia desses como hoje, frio e propenso a todo tipo de romantismo, aí temos o calor da pipoca e uma tela brilhante na frente. Covardes que somos!
Então, que faço? Resolvo que serei mais solitário que a solidão e mais triste que a tristeza. Quero apagar na história todos os registros de minha passagem. Quero não precisar de nada e nem de ninguém. Aceito os fatos, assimilo os fatos, adapto-me aos fatos. Não vai aparecer ninguém por essa rua vazia.
E ensaio meus próximos passos além do abismo. Não sei quem ou o que morre em mim. Tampouco sei quem ou o que vai nascer.
Estou atravessando minha ponte de cordas sobre o imenso abismo...