quinta-feira, novembro 08, 2007

Ainda a saudade

Em alguns momentos, todas as mulheres são Ela. E o são no que têm de comum a todas as mulheres, as quais eu sempre olho sem evitar me lembrar dela. E ao mesmo tempo não são, porque ela é uma mulher entre tantas, uma mulher entre todas.
A distância e a saudade, a impressão quase certa de que nada será como antes, tudo isso sendo carregado de um lado para outro, como uma bagagem que não se escolheu levar. Toda a história em seus mínimos detalhes repassada a cada instante na mente, como se isso fosse refazer a história ou dar-lhe outros contornos, eliminar as contingências, evitar as vicissitudes, para que tudo acontecesse sempre da melhor maneira que se possa querer.
Mais uma vez a caminho da universidade, depois de volta à estação do metrô, a presença dessa mulher ou de seu fantasma, esse tudo que aqui ficou e que não sei onde ponho e com o que não sei o que faço.
Se em tudo procuro dela me afastar, de um modo ou de outro tudo dela me aproxima. Na ausência dela há um ranço de presença, um rastro que indica que não levou tudo. Não consigo esvaziar-me, não consigo simplesmente abstrair qualquer lembrança, não me entrego ao esquecimento.
Eu me vejo ali naqueles lugares todos, como um tolo contemplando com incontida emoção tudo que não terei de volta. Tomo suas mãos a caminho do metrô. Outra hora estou sentado numa mesa de bar perto dela com um assunto qualquer, só para ter levado mais perto meu olhar de seus lábios, dos seus olhos e cabelos, do contorno dos seios. Para poder olhar disfarçadamente seu corpo quando se vai e quando volta dali a uns instantes. Para estar bem perto de seu sorriso, ouvir tudo o que diz mesmo que fosse em sussurros.
Mas ainda ontem refazia por outros motivos esse caminho. E à noite parece que as lembranças são mais vorazes em fazer doer em nós tudo de que sentimos falta.
Então eu me canso. Canso de tudo tão fácil demais e demoro, no entanto, para perceber esse cansaço. Tanto, que quando percebo, ele é extremo. Canso-me de olhar tudo em volta e tudo me fazer lembrar dela, ainda que não faça muita questão de esquecer, o que eu não queria mesmo era lembrar dessa forma, como uma falta que me faz, como ausência que me deixa incompleto, como impossibilidade que não me deixa viver sentindo-me inteiro.
O tormento, para tentar esquecer, é ficar repassando cada cena dessa história, o que excita a memória e provoca o efeito contrário do esquecimento. E é ainda mais do que simples lembrança, é o desejo de que esses momentos todos nunca tivessem acabado.
Não sei mais o que dizer a mim mesmo disso tudo que me atormenta. Sei apenas sentir-me atormentado pela grande possibilidade de ter que levar a vida a partir daqui sozinho, que é mais econômico e saudável, economiza muito de nossas emoções baratas que gastamos à toa e nos livra de estarmos doentes de sentimento, amor, um mal que parece não ter cura.
Tudo isso me leva a uma triste conclusão: sinto menos falta de mulher do que sinto dela.
Agora mais um prazo para uma dissertação de mestrado. Estou às voltas com minhas tão malfeitas leituras e sem saber do que quero falar. Filosofia, onde é que eu fui me meter? Epistemologia e subjetividade. Alguma coisa que faça uma ligação entre filosofia e literatura, o mundo do texto, os contos de Cortazar, os romances de Umberto Eco, as pinturas de Van Gogh. Mas o que eu quero saber, o que eu quero entender? Quero tentar entender como é que o artista cria e, conseqüentemente, como e por que cria. É uma boa pergunta. Mas por onde começar. Acho que me assusta o titulo de mestre. Sempre soube viver muito bem os bastidores de todos os meus talentos. Algum bloqueio me impede de colocar todos eles em cena.
Escrever algo que muita gente goste de ler. Esse é o sonho. Sei que é isso que eu sempre quis fazer, ainda que não soubesse ou demorasse a descobrir. Os livros sempre estiveram a minha volta, como o maior sinal no qual bastaria ter prestado um pouco mais de atenção.
Paciência! Antes tarde do que nunca.
Agora cuido do meu caldeirão de emoções baratas, cozinhadas em banho-maria.
Sou assim, parece que nunca quis ser outro. E pronto!

Nenhum comentário: