segunda-feira, janeiro 14, 2008

Mentira

Mentira! É mentira! Deve ser mentira que sinto tudo isso. Mentindo para mim ou para o mundo, para fora ou para dentro, diante do espelho, alastram-se no decorrer das horas todas as mentiras que inventamos para nós mesmos (e que funcionam também para os outros), talvez para a vida ficar mais fácil de ser vivida, para aplacar nossa melancolia e enganar nossos piores medos.
Medo sim! O medo da solidão, o medo do sofrimento, o medo da morte. O medo do fim inevitável de tudo, o que nos leva a mais possível certeza de que são tolas e sempre serão tolas todas as nossas esperanças. Estão solapados os alicerces de nossos castelos de sonhos. Vivemos em ruína, pobres seres errantes que somos, tristes órfãos, miseráveis grãos de poeira espalhados pelos ventos impetuosos do tempo.
Que merda é saber que houve um tempo em que gostavam de me ouvir sobre essas mesmas coisas. Gostavam desse meu modo de olhar para todas as coisas. Agora parece que mudaram todos eles seu próprio olhar para as coisas e eu continuo com o meu olhar, por falta de outro modo de ver. Não que eu não queira, mas talvez por não achar outro melhor.
Então é hora de me calar. Já sou um fantasma nas conversas, como aquele vovô que pensam que caducou, ou como um velho e rabugento tio, que não tem paciência para ficar ouvindo as pessoas se enganando o tempo todo sobre tudo.
Eu fiquei ouvindo da cadeira de balanço onde eu estava sentado reclamarem tanto hoje em dia dos relacionamentos, dos sentimentos, dos amores e das paixões. E vociferarem que não dá mais certo. Não existe mais a pessoa certa para determinada pessoa. Parece que as pessoas não se encaixam mais ou algo que mudou drasticamente no mundo não encaixa mais nelas. Eu tento gritar que sei o que falta, ou acho que sei, mas é melhor balançar um tanto mais nessa cadeira, ruminar minhas melhores lembranças, deixar-me embalar por meus mais doces pensamentos e pegar no sono com um sorriso de escárnio bem no canto da boca, que seja imperceptível ou não, todo mundo sabe que quem enlouquece ou perde simplesmente a razão, ou fica caduco, simplesmente ri à toa. Que assim seja. Pois nem isso funciona mais.
Ninguém mais namora, se apaixona ou se entrega como devia ao amor, eu diria entre dormindo e acordado, e voltaria a dormir para poder fingir bem que não disse nada.
Eu poderia dizer que é como “andar de bicicleta”. Mas antes tenho que ouvir uma ladainha de reclamações do tipo as bicicletas não são mais as mesmas, as ruas estão diferentes, tem muita subida pelo caminho, o selim machuca a bunda, os pneus nunca estão bem cheios. Em matéria de amor inventaram um outro modo de andar de bicicleta, não deu certo, tentaram outra vez, não vai dar certo, não vai dar certo. Há que se gritar isso pelos quatro cantos da cidade, espalhar em outdoors, em panfletos entregues aos passantes, não deu certo, não vai dar certo, não está dando certo. Em matéria de amor, desaprenderam a andar de bicicleta. Mas não me dêem ouvidos, há para mim a desculpa de ou ter perdido o juízo ou ter ficado caduco mesmo. E eu nem esqueci como se anda de bicicleta, mas faz tempo que não ando.Não pensem agora que eu quero estar certo, eu não quero. Eu sempre quero estar errado e é para mim sempre triste quando me ajudam a constatar que não estou. Eu vou vivendo as coisas aos poucos e aos poucos é que vou tentando entender. Sei que hoje quero apenas “andar de bicicleta”, deparar-me com aquela imensa ladeira e soltar os freios, quero sentir o vento na cara.

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