quarta-feira, outubro 17, 2007

Ao filho que amo

Meu filho caçula faz hoje quinze anos. Pudesse dar-lhe um presente que prestasse, daria um outro mundo, outra realidade. Daria uma vida com mais livros e menos TV, mais jogos na rua do que na tela do computador. Mais que todo avanço tecnológico que proporciona um sem par de utensílios que poderia lhe dar de presente, daria uma boa dose de fantasia, aquela coisa que acho que é própria dos meninos de se acharem o maioral, o mais forte, o mais inteligente, o mais bonito. Se bem que tudo isso ele já é de fato. Eu lhe daria, não sei de que modo, mais infância, afinal de contas, tudo o que mais faz falta aos infantes de hoje em dia. Fazer e não comprar, procurar e não ter à mão, criar um universo do qual é protagonista e não engolir um já criado onde é um figurante.
Seria imprescindível dar-lhe gostar da lua e das estrelas, gostar de árvores e de bichos, gostar de livros e olhar de vez em quando algumas pinturas. Daria a ele todas as palavras que tenho para ele construir suas próprias indagações e conseguir suas próprias respostas. E daria todas as boas noites de sono e sonhos de grandeza tão aceitáveis aos adolescentes, ainda que sejam para nós, chatos adultos, inaceitáveis.
E tentaria explicar a sensação de tomar um banho de chuva, sapatear em poças de água, ou o que é muito mais difícil, essa coisa toda que sentimos quando nos apaixonamos pela primeira vez. Daria o gosto pela amizade leal e sincera, e também aquela pirraça que temos que ter que só os amigos mais leais e sinceros podem suportar. E que viver nada mais é do que gostar da vida.
Tentaria ensinar tantas coisas que custei muito a aprender e mesmo as que ainda não aprendi. Quem sabe pudesse mostrar o quanto é bom ler e escrever poemas, desenhar mapas de mundos inexistentes, inventar e contar histórias, contar causos, rir à beça de uma boa peça pregada a alguém. Roubar fruta no quintal do vizinho, fazer um esconderijo no próprio quintal.
Tentaria mostrar o quanto é bom um toque de carinho, cafuné de mãe, risada de pai e pai babando alguma coisa que faz bem demais. E o quanto é bom ter irmãos, irmãs, primos e primas, tios e tias, avós. E que é uma aventura andar de ônibus de um lugar ao outro, ou ir a padaria comprar pão. E como é tão gostoso dançar e bolo sem nenhuma cobertura. E bolinho de chuva, pipoca, pastel, suspiro, bala de goma, rocambole. E ouvir música, saber que tudo é música.
E queria ser capaz de mostrar que crescer não dói e não é chato. A gente só não pode fazer mais algumas coisas mas pode fazer muitas outras mais. E nem precisa esquecer que foi criança um dia e gostar disso.
Enfim, se eu tivesse, por um passe de mágica, agora, minha infância de volta, mandaria embrulhar num papel dourado, e daria de presente ao filho que amo.

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