terça-feira, outubro 02, 2007

Última semana de setembro

Semana cheia essa que passou, a última do mês de setembro, afinal um mês qualquer, com suas coisas ruins e boas, cada uma delas na justa medida. Cheia de emoções corriqueiras, nem grandes nem pequenas, médias talvez, uns tantos minutos de fama que me tiraram do ostracismo, para me devolver a ele com a mesma rapidez e desenvoltura. O que fazer depois de conquistar Tróia? Querer conquistar Roma. E o que fazer depois de conquistar Helena? Querer o amor da própria Afrodite. Toda megalomania, ainda que só desejada, sonhada, tem que ser controlada, colocada nos limites do possível. Será mesmo que tem?
Na segunda não fui ao trabalho. Recebi um telefonema da universidade, avisando que dois poemas dos três que coloquei no concurso foram classificados. Classificados Beijo e Errando Poesia, fiquei matutando por que é que As Horas ficou de fora. Talvez tenham sido poucos concorrentes. Disseram que não, que foram apresentados duzentos poemas, então dos treze classificados dois eram meus. Desci imediatamente o chicote na megalomania. Calma lá com o andor.
Mas também me convidaram para ir ao estúdio de rádio da universidade, para gravar as minhas poesias, que na quarta-feira seriam colocadas no site da universidade. Fui lá e gravei. A professora responsável disse que estava ótimo, logo de primeira leitura, o operador da mesa de som, no entanto, pediu-me para repetir um ou dois trechos. Depois fui conferir o resultado no site e odiei a minha voz de taquara rachada, minhas poesias lidas sem a devida entonação e não passando a emoção adequada. Autocrítica inevitável! Eu bem que tinha dito que preferia as poesias lidas na voz do Paulo Autran. Não! Eu não sou nada bobo.
Na quarta-feira, estavam todas as poesias no site. Deu um frio na espinha, achei três ou quatro muito bons e eles não eram meus. Comecei a ensaiar saber perder, afinal de contas, não se pode ganhar sempre. E também nunca é possível agradar a gregos e troianos, o que se dirá também dos romanos, que achei de colocar na peleja. E aquela minha voz de taquara rachada. Tudo bem, não sou locutor de rádio, mas sou um reles poeta.
Enquanto o resultado não vem, vamos ao simposio. Nesta mesma quarta ouviu-se sobre Nietzsche, Para muito além do tédio. Os expositores foram competentes no que prepararam. Mas cá no ouvido doeu um pouco a história de trabalho contra o tédio e uma outra história sobre ócio produtivo. Talvez eu deva escrever algo sobre como conviver com o que achamos que é tédio, embora eu concorde que ele exista, prefiro ele a um monte de coisa por aí. Quanto ao ócio, taxa-lo de produtivo, ou querer que o seja, é transformar o ócio em algo que ele não é. Ócio é ócio e pronto. Se estiver a produzir alguma coisa, por simples e pequena que seja, já não tenho mais ócio. Preciso pensar melhor nisso.
Valeu esse dia para depois da palestra, a caminho do metrô, achar aquele que seria meu futuro gato de estimação. Quer dizer, não fui eu quem o achou, minha grande amiga o achou por mim. Levamos ele para a casa dos gatos, onde já há sete residentes e pelo menos uns cinco visitantes nos telhados vizinhos. Hospedou-se lá por essa noite ao menos, para a decisão de quem ficaria com ele, Trinity ou eu. Eu ainda acho que ela planejou tudo direitinho, porque depois poderá se ver que quem ficou com ele fui eu.
Na quinta-feira perdi grande parte da palestra, sobre o tempo, porque fiquei perdendo meu tempo aqui no Centro da cidade, noite quente, cerveja gelada no copo. Mas foi o dia de decidir levar o gato. Lá fomos nós dar uma nova moradia para esse gato. Agora com nome: Logan. Pois é, por algum tempo, Trinity carrega nas costas uma marca de suas garras, quando tentou fugir. Fugir talvez não, tentou voltar para a rua. E ele foi para casa na caixa de transporte, no metrô, e nem sabíamos se isso era permitido ou não.
Sexta-feira, dia de trabalho e final do concurso de poesia. Eu preocupado com o Logan sozinho em casa. Pronto! Agora eu tenho um gato. Sempre me dá um nervoso não sei porque nessas horas de resultados. Se envolvesse sorte, tudo bem, porque sei que não tenho sorte, então qualquer um ganharia. Tivemos que ler os poemas e eu subi ao palco para ler logo os dois. Tive que caprichar dessa vez na entonação e na emoção da leitura, afinal, pela primeira vez nesses concursos, minha filha estava lá prestigiando. Terminadas as leituras, aqueles trinta ou quarenta minutos de coral, musica para alegrar o ambiente. Eles retornam logo depois com o resultado. Deram-me o segundo lugar. Quer dizer, premiaram-me pela terceira vez consecutiva. Ainda tenho que ouvir aqui dos amigos do trabalho que eu não ganhei nada, perdi o primeiro lugar. Primeiro lugar? Que tolice imensa, penso eu, sem dizer nada, com minha costumeira modéstia. A questão é que começo a ficar preocupado, porque sei o que me leva a escrever poesias, e sei também em que estado de espírito as escrevo. Sempre coloquei nesse concurso as três a que tenho direito. Em 2005 deram-me o terceiro lugar, o primeiro lugar em 2006 e agora o segundo. Ano passado classifiquei duas em dez e este ano duas em treze, dizem que essas treze selecionadas de duzentas. Isso me preocupa bastante. Se as pessoas gostam do que escrevo, tenho que continuar a escrever. Nada de pretensões literárias e monetárias, ao menos por ora, que sou perito em não ganhar dinheiro. Mas é incrível ver alguma coisa dar certo nesse universo de coisas tortas e desengonçadas, mal ajambradas que tem sido a vida.
Logan estava vivo na sexta-feira, depois de ficar o dia inteiro sozinho. Deve ter ficado dormindo. Comportou-se bem na festinha que fizemos para ele, comendo somente sua ração e não querendo nosso macarrão com arroz e fritada de ovos. Experimentou o colo de todo mundo, brincou e fez gracinhas. Gato atrevido e exibido, loiro de olhos claros, pensa que é o Brad Pitt.
No sábado, tendo eu dormido até quase meio-dia, tive que ter com ele uma conversa séria sobre como as coisas funcionam em casa. A caneta se mexendo sobre o papel não é brinquedo, mesa não é cama quando tem comida em cima, eu não como a comida dele e ele não come a minha. Eu recolho as fezes dele e ele não vai precisar recolher a minha. Tudo bem que dividamos a poltrona, ela é suficientemente grande para nós dois, mas não serve para afiar as garras, assim como não serve também as costas de minhas amigas.
Domingo teve mais visita para o gato. Três dias em casa e ele já recebe para ele mais visitas do que eu. Tenho que insistir sempre naquela história de posição na cadeia alimentar, mas ele não parece gostar dessa história.
Ontem tive que acabar de arrumar toda a minha papelada depois da estante nova na sala e uma redistribuição dos livros. Ele parece não perceber o que é trabalho e o que é brincadeira. E ontem estava simplesmente impossível, correndo pela casa toda.
Pois é, eu até que estava bem quieto no meu canto.
Mas tinha que me aparecer um gato no meio do caminho.

PS.: com o prêmio do concurso de poesia, mais cinco livros em minha estante, três do Umberto Eco, um Michel Onfray e um Drumond de Andrade. E vontade nascida no final de semana de começar um projeto de tese. E não vai ser sobre epistemologia.

Nenhum comentário: